Extremo norte da antiga Rua do Loureiro (actual Gustavo Ferreira Pinto Basto),
entre o Teatro Aveirense e a Câmara Municipal.
Em frente, a parte demolida da casa de José Estêvão.
(Autor desconhecido. 1905. Colecção Morais Sarmento)
Pedestal ainda sem a estátua de José Estêvão
(Autor desconhecido. Sem data.
A fotografia é, contudo, anterior a 12 de Agosto de 1889,
data da inauguração do monumento. Colecção Morais Sarmento)
Inauguração do monumento a José Estêvão, em 12 de Agosto de 1889
(Autor desconhecido. Colecção Morais Sarmento)
Praça do Município cerca de 1910
(Autor desconhecido. Sem data)
Praça e monumento a José Estêvão
(Autor desconhecido. Sem data.
Anterior, contudo, a 1939, ano em que foi retirado
o gradeamento em volta da estátua.
Colecção Énio Semedo)
Monumento de José Estêvão
(Autor desconhecido. Sem data)
Praça da República, Liceu e monumento a José Estêvão
(Autor desconhecido. Sem data, mas anterior a 1939)
Paços do Concelho e José Estêvão
(Autor desconhecido. Sem data, mas anterior a 1939)
Estátua de José Estêvão
(Autor desconhecido. Sem data, mas anterior a 1939)
Monumento de José Estêvão
(Edição Emílio Biel & Cª, Porto, postal nº 191, série geral.
Sem data, mas anterior a 1939)
Liceu
(Edição Emílio Biel & Cª, Porto, postal nº 192, série geral. Início do século XX)
Igreja da Misericórdia
(Autor desconhecido. Sem data.
A grafia "egreja" remete, todavia para antes de 1911)
Teatro e Liceu
(Autor desconhecido. Sem data.
Praça da República e monumento a José Estêvão
(Autor desconhecido. Sem data, mas anterior a 1939)
Praça da República em 1935
(Colecção Morais Sarmento)
Monumento a José Estêvão
(Edição Souto Ratola, Aveiro. Sem data, mas anterior a 1939
Colecção Morais Sarmento)
Praça da República e igreja da Misericórdia
(Autor desconhecido. Sem data)
Praça da República
(Autor desconhecido. Sem data, mas posterior a 1939)
Demolição dos prédios por detrás da estátua de José Estêvão, em 1964
(Colecção Carvalhinho, Américo Carvalho da Silva)
Demolição dos prédios por detrás da estátua de José Estêvão, em 1964
(Colecção Carvalhinho, Américo Carvalho da Silva)
Praça da República cerca de 1967, já com o edifício
projectado pelo arq. Fernando Távora
(Autor desconhecido. Sem data)
Notas à margem
1- A
actual Praça da República ocupa aproximadamente o espaço onde se
erguia a muito antiga igreja de S. Miguel, que foi, até 1835, ano da
sua demolição, o maior e mais importante templo da cidade. Não se
sabe ao certo a que século remonta a sua construção, mas já era
referida em documentos da época da reconquista cristã.
A
decisão de demolir a igreja de S. Miguel foi da responsabilidade do
primeiro Governador Civil de Aveiro, José Joaquim Lopes de Lima,
nomeado pouco antes para o cargo (25 de Julho de 1835), quando era
Ministro do Reino o Duque de Saldanha. Por alvará de 11 de Outubro
de 1835, determina que sejam reduzidas a duas as quatro freguesias da
cidade: a da Vera Cruz, compreendendo o território desta e o de
Nossa Senhora da Apresentação; e a de Nossa Senhora da Glória,
compreendendo a área das extintas freguesias de S. Miguel e do
Espírito Santo. Pelo mesmo alvará determina ainda que sejam
demolidas as igrejas de S. Miguel e do Espírito Santo.
A
demolição da igreja de S. Miguel é iniciada quase de imediato, a
19 de Outubro. Segundo Rangel de Quadros, sendo difícil encontrar em
Aveiro operários que procedessem à demolição, foram utilizados
presos que se encontravam no Forte da Barra.
Curiosamente,
a 22 de Dezembro do mesmo ano, Luiz da Silva Mouzinho de Albuquerque,
que sucedeu ao Duque de Saldanha no cargo de Ministro do Reino,
censurou asperamente, numa portaria, “a obra vandálica da
destruição da igreja de S. Miguel” de Aveiro.
Não
deixa de ser interessante recordar alguns dos últimos actos
religiosos que, em 1835, tiveram lugar nesta antiquíssima igreja:
1 de Março: último casamento, de
Domingos Simões Peixinho com Rosa Angélica;
13 de Agosto: último enterramento,
que foi o do capitão João Dionísio, da freguesia da Vera Cruz.
Recorde-se que, a 12 de Dezembro deste mesmo ano, teve lugar o
primeiro (e contestado) enterramento no recém criado cemitério
público, o actual Cemitério Central de Aveiro;
26 de Setembro: último baptizado,
que foi de Maria do Rosário, filha de António Pereira da Cunha e
de D. Emília Rosa Cândida;
A
18 de Outubro, dia anterior ao do início da demolição, as
principais imagens da igreja de S. Miguel foram conduzidas
processionalmente para a vizinha igreja do extinto Convento
Dominicano de Nossa Senhora da Misericórdia, sede da nova freguesia
de Nossa Senhora da Glória, acabada de criar pelo referido alvará
do Governador Civil.
Em
Abril de 1840, cerca de cinco anos depois da demolição, a Câmara
Municipal, então presidida por Francisco Henriques da Maia, manda
proceder ao arranjo do largo fronteiro aos Paços do Concelho, onde
haviam sido a igreja e o adro de S. Miguel. A obra, arrematada por
Simeão Ribeiro de Paula, de Aveiro, custou 450.000 réis.
Em
1903, dando continuidade ao melhoramento do largo, a Câmara
Municipal, então da presidência de Gustavo Ferreira Pinto Basto,
manda proceder ao calcetamento da praça.
A
5 de Agosto de 1964, quando era Presidente da Câmara Henrique Álvaro
Pires de Mascarenhas, começa a demolição dos prédios que se
situavam por detrás da estátua de José Estêvão, para aí se
construir um novo edifício municipal, com projecto do arquiteto Fernando Távora, o mesmo que existe ainda hoje.
2-
Ao
tempo em que foi demolida a igreja de S. Miguel, já existia o actual
edifício da Câmara Municipal, construído em fins do séc. XVIII. O
facto de se dotar a Câmara com novas e mais dignas instalações
prende-se certamente com a elevação de Aveiro a cidade, a 11 de
Abril de 1759, graças à “real benignidade” (como se lê no
documento régio) do rei D. José. Recorde-se que, na sequência do
processo dos Távoras, por alegada tentativa de assassínio do rei,
em que também foi indiciado o 8º (e último) Duque de Aveiro, este
acabou executado a 13 de Janeiro de 1759, sendo, em consequência,
extinto o ducado e confiscados todos os seus bens em favor da coroa.
Logo no início do processo, a então vila de Aveiro apressou-se a
testemunhar ao rei a sua inteira fidelidade. A “real benignidade”
do monarca, ao elevar Aveiro a cidade, foi pois, possivelmente, uma
forma de recompensar a sua fidelidade.
O
novo edifício da Câmara, cuja construção se prolongou por cerca
de três anos, não sofreu grandes alterações ao longo do tempo. No
rés do chão, começou por estar instalada a cadeia, que depois foi
transferida para outro local.
Refira-se,
como simples curiosidade, que, segundo Rangel de Quadros, o chamado
“sino da ronda” deixou definitivamente de se tocar na torre dos
Paços do Concelho a 1 de Outubro de 1892. O toque do sino da ronda
era um costume que vinha de séculos passados e destinava-se a chamar
os noctívagos a casa.
3- “Embora
não esteja documentada a data exacta da fundação da irmandade da
Misericórdia de Aveiro, esta é atribuída por tradição ao ano de
1498, logo após a fundação da Misericórdia de Lisboa. Sabe-se que
em 1502 a irmandade funcionava em pleno, uma vez que na época foram
feitas doações à mesma, para além de os irmãos terem recebido
uma carta de privilégios dada por D. Manuel nesse ano.
A
primitiva sede da irmandade funcionava na Capela de Santo Ildefonso,
junto à igreja paroquial de S. Miguel, tornando-se no entanto
evidente a reduzida funcionalidade da mesma para servir as obras de
assistência da Misericórdia numa vila com uma intensa vida
comercial e marítima, ligada ao Atlântico e às colónias
ultramarinas.
Ao
longo do século XVI a irmandade intentou esforços para patrocinar a
construção de uma igreja própria, bem como de um hospital, e em
1585 D. Filipe I concedeu à irmandade aveirense os mesmos
privilégios de que usufruia a Miseriória de Coimbra.
A
obra de edificação do templo iniciou-se em 1600, sendo contratado
para a execução da traça o mestre Gregório Lourenço. A primeira
pedra da igreja era lançada ainda nesse ano. (…) No ano de 1608 a
Casa do Despacho estava já concluída e o corpo do templo
encontrava-se edificado, faltando executar o pórtico principal e o
espaço da capela-mor. Em 1615 o hospital ficava concluído. No
entanto, a fábrica de obras foi sendo interrompida por falta de
apoios financeiros, e a capela-mor só viria a ser concluída entre
1650 e 1655, durante a provedoria de D. Raimundo de Lencastre, Duque
de Aveiro. (…) Somente em 1669 a Capela de Santo Ildefonso deixou
de ser utilizada pela irmandade, pelo que se depreende que nesta data
a estrutura do templo da Misericórdia estava concluída. (…) A
fachada foi “revestida por azulejos em 1876”.
IGESPAR,
“Igreja da Misericórdia de Aveiro, incluindo as salas de despacho
e anexos”
4- Do
lado poente da Praça da República fica o edifício do primeiro
liceu de Aveiro, por cuja criação se bateu insistentemente José
Estêvão. A sua construção foi iniciada em 1855, quando o
Ministério das Obras Públicas, Comércio e Indústria, criado três
anos antes, era ocupado, desde a sua criação, por Fontes Pereira de
Melo, que deu um incremento notável às obras públicas em Portugal,
ao ponto de esses anos em que ocupou o ministério passar a ser
designado como “fontismo”. As obras do Liceu prolongaram-se até
1860, tendo a inauguração acontecido a 15 de Fevereiro.
O
Liceu, cujo projecto é de um mestre de obras aveirense, Ricardo da
Maia Romão, ocupa o lugar onde antes existia a albergaria de S.
Brás, tendo, aliás, a pedra deste edifício sido utilizada na nova
construção, além de pedra das muralhas de Aveiro, mandadas demolir
pelo príncipe regente D. João, futuro D. João VI.
5- Apenas
dois anos após o início das obras do Liceu, portanto em 1857, teve
início a construção do Teatro Aveirense, para o que a Câmara
Municipal adquirira pouco tempo antes o terreno necessário. Todavia,
por falta de verba, as obras foram interrompidas logo em 1858, até
que, no final da década de setenta, se conseguiu formar um grupo
responsável pela conclusão das obras e futura gestão do espaço, a
Sociedade Construtora e Administrativa do Teatro Aveirense. As obras
só ficaram concluídas no início da década de oitenta, quando era
presidente da Câmara Sebastião de Magalhães Lima. A inauguração
do Teatro ocorreu em fins de 1881, tendo a peça de estreia sido
encenada pela Companhia do Teatro Nacional de D. Maria II em Março
do ano seguinte.
Com
o fim do regime monárquico, o Teatro encerrou para obras de
adaptação a novas funcionalidades, como o cinematógrafo, reabrindo
em 1912.
Mais
tarde, entre 1947 e 1949, procedeu-se a nova remodelação, quer do
interior, quer da fachada voltada para os Paços do Concelho.
Por
fim, em 1998, e tendo em vista a preservação do imóvel, a
autarquia adquiriu o edifício do Teatro e procedeu a uma série de
intervenções visando o ajustamento do espaço às novas exigências,
tanto no que se refere à comodidade como às próprias necessidades
dos espectáculos.
6- O
centro da praça é ocupado pela estátua de José Estêvão,
aveirense ilustre a quem a cidade ficou a dever relevantes serviços.
A ele se devem, a título de exemplo, o novo liceu de Aveiro, assim
como o facto de a ligação ferroviária entre Lisboa e Porto passar
por Aveiro, o que não estava previsto no plano inicial.
Curiosamente, José Estêvão, falecido a 4 de Novembro de 1862, não
pôde assistir à chegada do comboio à sua cidade, que só aconteceu
em Abril de 1864.
Dezoito
anos após a sua morte, em 1882, um grupo de aveirenses tomou a
iniciativa de erigir um monumento em sua memória, lançando para
isso a primeira pedra a 8 de Maio desse ano, prosseguindo depois as
obras do pedestal sob a direcção de Manuel Homem de Carvalho
Cristo. A 3 de Junho, o Governo concede, por lei, o bronze necessário
para fundir a estátua. Mas só em 1886 a comissão responsável pelo
monumento celebra com o escultor lisboeta José Simões de Almeida
Júnior o contrato para a execução, por 1.100$000, do modelo em
gesso da estátua. E só a 28 de Abril de 1888 é concluída a
fundição da estátua, em bronze, no Arsenal do Exército, em
Lisboa. A 21 de Abril de 1889, a estátua, transportada de comboio, é
desembarcada, não na estação de Aveiro mas na passagem de nível
de S. Bernardo, por especial concessão da Companhia dos Caminhos de
Ferro Portugueses, e depois transportada para o largo do município.
Recorde-se que, na altura, a estação só tinha ligação ao centro
da cidade através da Rua Cândido dos Reis.
Por fim, a 12 de Agosto
de 1889, o monumento foi inaugurado, na presença da viúva, D. Rita
Moura Miranda Magalhães.
Bibliografia breve
- Rangel de Quadros, "Aveiro, Apontamentos Históricos"
- Amaro Neves, "Aveiro, História e Arte"
- IGESPAR, "Teatro Aveirense"
- IGESPAR, "Igreja da Misericórdia de Aveiro"
- Aveiro e Cultura, "Calendário Histórico de Aveiro"
- Aveiro e Cultura, "Arquivo Digital"